Raymond Williams e o marxismo – I

Imagem: Anh Nguyen
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Por CELSO FREDERICO*

Williams é materialista, mas a matéria para ele é, desde o início, a matéria social plena de significados humanos

Raymond Williams até há pouco tempo era um autor desconhecido fora da Grã-Bretanha e raras vezes incluído entre os pensadores ligados à tradição marxista,[i] apesar de ter escrito uma extensa obra em que inovou e elevou a um patamar superior o que os marxistas haviam escrito até então sobre cultura. Em diversas obras sobre a história do marxismo o seu nome não é mencionado. Vejam-se, por exemplo, livros notáveis como a obra clássica de Pedrag Vranicki[ii] ou a conhecida História do marxismo, organizada por Eric Hobsbawn – ambas pesquisas minuciosas em que Raymond Williams não comparece – ou ainda a obra organizada por Stefano Petrucciani [iii] na qual, no capítulo sobre o marxismo anglo-saxão escrito por Alex Callinicos, Raymond Williams tem seu nome citado uma única vez ao lado de outros autores representativos do marxismo britânico. Perry Anderson, escrevendo sobre o marxismo ocidental, reservou a Raymond Williams uma nota de rodapé, para afirmar que ele foi “o mais eminente pensador socialista saído da classe operária ocidental”, embora entenda que o seu trabalho “não foi o trabalho de um marxista”.[iv]

Raymond Williams considerava-se antes de tudo crítico literário e, também, escritor de romances, peças de teatro, roteiros cinematográficos etc. que permaneceu nas margens da academia, atuando longos anos na educação de adultos. Por uma ironia do destino ficou conhecido e consagrado como teórico marxista da cultura.

Marxista? O próprio Raymond Williams, contudo, contornou a pergunta definindo-se como alguém que pertence à tradição socialista e comunista, e considerava um erro “reduzir toda uma tradição, ou toda uma ênfase dentro da tradição, ao nome da obra de um só pensador”. Trata-se, acrescentou, de “uma tradição militante, da qual participaram milhões de homens, ou uma tradição intelectual, da qual participaram milhares de homens” [v]. Incluindo-se nessa corrente de pensamento, o crítico literário estabeleceu uma enriquecedora relação crítica com o legado de Marx que contribuiu para desenvolver a reflexão marxista sobre cultura.

O marxismo, como se sabe, não teve grande influência política na Grã-Bretanha. A divulgação das ideias marxistas esteve a cargo principalmente do frágil e inexpressivo Partido Comunista, sendo, por outro lado, hostilizado por um Partido Trabalhista reformista com forte presença no movimento sindical. Raymond Williams militou naqueles dois partidos por um período de tempo curto. Depois, pouco antes de morrer, filiou-se num partido que defendia o nacionalismo galês (Plaid Cymru, Partido Galês), onde permaneceu por menos de dois anos.

Não foi propriamente um “intelectual orgânico” no sentido gramsciano, pois faltava na Grã-Bretanha “uma contra-esfera pública”, como observou Terry Eagleton. Sem o respaldo de um forte movimento operário e de partidos revolucionários, Raymond Williams foi levado a “ocupar um espaço indeterminado a meio caminho entre uma academia atuante, mas reacionária, e uma contra-esfera pública desejável, mas inexistente”.[vi] Stuart Hall, ao referir-se aos seus companheiros dos Estudos Culturais, utilizou a estranha definição “intelectuais orgânicos sem qualquer ponto orgânico de referência” [vii], o que, também, está distante da concepção gramsciana.

Apesar do isolamento, da inexistência de forças sociais voltadas à revolução social, Raymond Williams nem por isso deixou de atuar até os últimos dias nos movimentos sociais, empenhando-se na campanha pelo desarmamento nuclear, na defesa da ecologia, na luta feminista etc. Em suma: foi sempre um combatente fiel à sua concepção de socialismo. Essa fidelidade ao socialismo, contudo, conviveu sempre com uma relação tensa e heterodoxa com o legado marxiano, marcada por sucessivas aproximações e distanciamentos.

Mas, nem por isso se deve negar sua inestimável contribuição teórica nas questões culturais, área pouco frequentada pelos marxistas britânicos. Suas primeiras obras como Cultura e sociedade e A longa revolução obtiveram enorme sucesso de público, obtendo grandes tiragens. A presença de Raymond Williams no cenário cultural britânico foi marcante até a década de 1980, quando as discussões sobre multiculturalismo desviaram as atenções sobre o significado da tradição cultural.[viii]

Cultura e sociedade procurou problematizar a tradição cultural, resgatando seus aspectos críticos em relação aos efeitos da Revolução Industrial, presentes tanto em autores conservadores como progressistas, mas criticando em ambos a redução da cultura à alta cultura, acompanhada sempre de sua sombra, a degradada cultura de massas. Contra essa visão fragmentada e elitista, Williams reivindicou a ideia de uma cultura em comum, indicando com ela os caminhos que irá seguir doravante, caminhos próprios, distante tanto da crítica literária conservadora quanto do marxismo.

O afastamento de Raymond Williams em relação à tradição marxista rendeu, à época, diversas críticas. A mais elaborada foi feita pelo consagrado historiador Edward Thompson, em 1961. Em dois longos ensaios criticou Cultura e sociedade e A longa revolução minuciosamente, apontando seus pontos frágeis. Thompson constatou que Raymond Williams havia travado “uma discussão oblíqua com o marxismo” sem, contudo, confrontar-se com Marx. Outro ponto assinalado, entre tantos, é a definição de cultura como “um modo integral de vida” que, à semelhança de T. S. Eliot, excluía o conflito. Ao invés de “modo de vida”, E. P. Thompson prefere falar em “modo de luta”.[ix]

A tese marxiana segundo a qual é o ser social que determina a consciência havia sido convocada por Raymond Williams para substituir a relação base-superestrutura, mas convivia, segundo Thompson, com a ideia de uma “cultura comum” que ignorava o momento da contradição e da luta e, principalmente, a sua determinação material. Portanto, era a cultura o que determinava no primeiro Raymond Williams o ser social. Mas a história, acrescentou Thompson, é contradição, é luta de classes.

Sendo assim, “somente numa sociedade livre e sem classes a história se tornará a história da cultura humana porque somente então a consciência social irá determinar o ser social” [x]. Portanto, só no comunismo se poderá falar em “cultura comum” e no papel da consciência conduzindo a produção material voltada enfim para satisfazer as reais necessidades humanas.

Raymond Williams não respondeu a Thompson. Muitos anos depois, lembrou que Thompson apontou “algumas coisas necessárias e corretas”, mas procurou justificar a ausência do conflito como decorrência do momento histórico por ele estudado: “Senti nos textos de Edward um forte apego aos períodos heroicos da luta na história, o que era muito compreensível, mas tal como foram formulados eram particularmente inadequados para tratar a década não heroica que acabávamos de viver”.[xi]

Essa crítica e outras feitas à época calaram fundo em Raymond Williams, levando-o daí em diante a recuos e retificações conceituais, como se pode facilmente constatar em A política e as letras, livro em que toda a obra do autor foi submetida a intenso interrogatório e contestações sempre muito bem formuladas pelos entrevistadores Perry Anderson, Anthony Barnett e Francis Mulhern, integrantes do comitê editorial da prestigiosa New Left Review.

Impressionam a coragem e a serenidade com que Raymond Williams defendeu suas ideias ou acatou as duras críticas. Respondeu a todos com modéstia e firmeza. Trata-se, até onde sei, de um livro único nas ciências sociais, uma hora da verdade em que todos os livros escritos por um autor são discutidos ponto a ponto sem condescendências. Sua leitura tornou-se obrigatória para os estudiosos que, assim, podem consultar os capítulos referentes a cada uma das obras e pôr-se a par das críticas e das respostas do autor.

Romantismo revolucionário

Durante as entrevistas Raymond Williams afirmou que nunca se esqueceu de suas origens proletárias e da vida comunitária que vivenciou no País de Gales. Olhando retrospectivamente para o livro Cultura e sociedade, lembrou: “a minha experiência galesa operava inconscientemente na estratégia do livro. Pois quando o concluí com uma discussão da comunidade e solidariedade cooperativa, eu estava de fato escrevendo sobre as relações sociais galesas”.[xii]

Comunidade: expressão de uma sociedade solidária e, também, referência central para a construção do socialismo. Robert Sayre e Michael Löwy encontraram em Raymond Williams um aliado na definição do marxismo como uma das expressões do “romantismo revolucionário”. Como outros autores, ele teria buscado no passado “uma inspiração para a invenção dum futuro utópico” [xiii]. Esse passado, em Raymond Williams, caracteriza-se pela solidariedade operária e pela presença de uma cultura com potencial de resistência. Ciro Flamarion Cardoso observou, a propósito, que Raymond Williams “acreditava na existência de uma tradição de pensamento “radical” sobre a cultura, especificamente britânica, na qual incluía William Morris em posição de máximo destaque” e, também, na “possibilidade de uma revivescência cultural de base popular”.[xiv]

Desde o início, a reflexão unificada sobre cultura, comunidade e política, se fez presente na obra de nosso autor. Trata-se, sem dúvida, de um “pensamento vivido” fiel às suas origens e que o acompanhou em todos os momentos, como bem demonstrou o seu biógrafo Dai Smith.[xv] Em 1982, a ideia de comunidade continuava orientando o horizonte político de Williams: “Em minha própria concepção, o único tipo de socialismo que tem alguma possibilidade de se implantar, nas velhas sociedades industrializadas burguesas, seria centrado em novos tipos de instituições comunais e coletivistas” [xvi].

Os temas tratados por Raymond Williams são os mais diversos, mas sua formação básica é de crítico literário numa Grã-Bretanha em que a literatura esteve no centro das preocupações intelectuais. Desde o século XIX havia se consolidado uma tradição de pensamento que se opunha aos efeitos da Revolução Industrial sobre a civilização, conhecida pelo nome Culture and Society – não por coincidência título de uma das primeiras obras de Williams. A crítica ao industrialismo, feita em nome do humanismo romântico, atraiu um conjunto expressivo de autores, como Thomas Carlyle, Matthew Arnold, T. S. Eliot e William Morris.

Mas foi um discípulo de Arnold, Frank Raymond Leavis, que, após a Primeira Guerra Mundial, pôs-se à frente na defesa da cultura inglesa ameaçada pela vulgaridade da cultura de massa. O caráter moral e político assumido pela literatura foi assim resumido: “Carlyle, Arnold e Leavis codividem um questionamento sobre o papel da cultura como instrumento de reconstituição de uma comunidade, de uma nação, em face das forças dissolventes do desenvolvimento capitalista. Os estudos culturais participam desse questionamento, mas, na trilha de Morris, optam de modo decisivo por uma abordagem via classes populares”.[xvii]

Nesta última direção se inserem os trabalhos de Richard Hoggart, Edward Thompson e Raymond Williams. Em Cultura e sociedade Raymond Williams percorreu as interpretações conservadoras sobre a crise da cultura cristalizadas na tradição. Curiosamente, não se ateve ao caráter politicamente conservador, quando não reacionário, da maioria desses intérpretes, pois o seu objetivo, como afirmou posteriormente, era “tentar recuperar a complexidade real da tradição que havia sido confiscada”.[xviii] Com essa leitura a contrapelo, procurou resgatar os germes progressistas da tradição cultural britânica, radicados na crítica romântica da civilização industrial.No último capítulo entra em cena a classe operária que, com seus escritores como William Morris, mantinha também afinidades eletivas com a tradição romântica.

A longa revolução traz uma mudança na interpretação da Revolução Industrial: ela, como parte de uma “longa revolução” nada tem de regressiva e nem se restringe ao frio “industrialismo” que teria corroído a pretensa “comunidade orgânica”, pois trouxe consigo o advento da democracia de massa, o letramento, o romance realista, os meios de comunicação de massa e a ampliação da democracia. Nesse contexto, a cultura deixa de se identificar apenas com as obras de arte desfrutadas por uma minoria e desligada da vida social para ser entendida como um “modo de vida”, algo comum a todos, presente na vida social.

A guinada subjetiva

Uma das principais características da obra de Raymond Williams é o deslocamento da ênfase das estruturas, tão comum nas versões dogmáticas do marxismo, para a valorização da subjetividade e das “práticas significativas” constitutivas da realidade social. Desse modo, ele distanciou-se de Engels e Lênin, autores que afirmam a prioridade da matéria sobre a consciência, postulado que sustenta a teoria do reflexo. Raymond Williams é materialista, mas a matéria para ele é, desde o início, a matéria social plena de significados humanos. Quando permanece na crítica literária, essa concepção mostra-se adequada, já que aí o objeto, o artefato literário, só existe pela atividade prévia do sujeito.

Mas, para a teoria social, no caso, o marxismo, ela apresenta problemas, pois a prioridade ontológica da natureza coloca sempre resistências ao ativismo da consciência. Sem esse outro do ser social, a “consciência prática” se desenvolve sem enfrentar a dura resistência da natureza. O homem, assim, é visto não mais como um ser natural-social, e sim como um ser desde sempre social. Além disso, corre-se o risco de adentrar-se num pensamento anticientífico que submete a natureza à teoria da história.

Alguns dos representantes do chamado “marxismo ocidental”, como o Lukács de História e consciência de classe, Karl Korsch e Gramsci, antecederam Raymond Williams nessa perspectiva, deslocando-se para as fronteiras do idealismo. A “superação” da natureza, numa realidade puramente social, facilitou o descarte da teoria do reflexo e do primado ontológico da matéria sobre a consciência. Virar as costas para o velho materialismo teve também implicações políticas: fez com que a “consciência prática”, que em Lênin não ia além da “consciência sindical”, bastasse a si mesma, não precisando mais ser socorrida pela teoria revolucionária e pelo partido político.

Não por acaso, Raymond Williams afirmava “acreditar na luta econômica da classe trabalhadora”, considerando-a “a atividade mais criativa de nossa sociedade” [xix]. Esta visão trabalhista, conferindo centralidade às “práticas significativas” e à “consciência prática”, reafirma a ênfase na subjetividade. Assim, coerentemente, Raymond Williams pôde escrever em Recursos da esperança, que o socialismo, além da ação e organização, “incluirá sentimento e imaginação”.[xx]

Conceitos inéditos na tradição dos estudos marxistas acompanham o resgate da subjetividade: “tradição seletiva”, “experiência”, “emoção”, “estrutura de sentimento”. Este último é o mais importante deles e o mais significativo das dificuldades de se fugir da visão dual que tradicionalmente separa objetividade de subjetividade, natureza de sociedade, ser de consciência. “Estrutura de sentimento” é uma expressão compósita visando unir aquilo que é duro e fixo (estrutura) com o que é maleável e fluido (sentimento). Essa junção anuncia uma dificuldade – ela é a antevisão de um problema, a tentativa de se aproximar de algo escorregadio, o esforço para nomear algo que ainda não se domina e não se deixa fixar através de conceitos definitivos.

Marx, em sua juventude, lançou mão de expressões assemelhadas. Inicialmente, falou em “atividade empírica” e “atividade sensível” para, assim, conciliar Hegel e Feuerbach. Depois, quando estudou a economia política, foi além desses dois autores, ao se referir à “atividade produtiva”, ao “trabalho” e à “práxis” – mediações astuciosas que englobam numa unidade contraditória a matéria e a consciência. Assim, nas obras maduras de Marx, o que sobe para primeiro plano no processo civilizatório é a mediação material, vale dizer, a fabricação de instrumentos de trabalho e o desenvolvimento das forças produtivas, e não mais o primado do trabalho sobre a linguagem, como quer Engels, ou a consideração de que ambos são fenômenos constitutivos sem hierarquia, como quer Raymond Williams.

A expressão “estrutura de sentimento” é sintoma de uma questão a ser enfrentada mais do que um conceito preciso. Sua origem provém da crítica literária, terreno em que Raymond Williams a utiliza com mestria para encontrar, em diferentes autores de uma geração, pontos em comum, sentimentos compartilhados. Apesar das diferenças, haveria neles traços comuns, o que sinaliza a existência de certa estruturação dos sentimentos. Um dos exemplos estudados no livro Cultura e materialismo é o grupo cultural conhecido como O círculo de Bloomsbury, que reunia pessoas com ocupações tão diversas como Virgínia Woolf e John Maynard Keynes.[xxi]

A dificuldade surge quando o conceito passa da esfera literária para o estudo da sociedade. No livro A longa revolução, Williams afirma: “Em certo sentido, a estrutura de sentimento é o resultado específico da vivência de todos os elementos de uma organização geral”. Essa definição sofreu críticas em A política e as letras por ser imprecisa, já que, num determinado momento histórico convivem várias gerações. E, além disso, a expressão parece possuir um caráter pluriclassista – algo comum que englobaria todas as classes sociais [xxii].

O conceito de “estrutura de sentimento” apoia-se na experiência dos indivíduos, na esfera do vivido. Mas, “experiência vivida” equivale a conhecimento? Ela se relaciona diretamente com o real? Para o empirismo, sim. Em seu confronto com a metafísica, que pretendia encontrar a verdade no próprio pensamento, o empirismo vai encontrá-la na experiência. Esta, por sua vez, apoia-se na certeza imediata que dispensa a mediação. É justamente contra essa presunção do saber imediato que a dialética, desde Hegel, se constituiu.

Tal saber fornecido pela experiência, dizia Hegel, é prisioneiro da particularidade. A passagem para o universal, como quer a dialética, se faz através da reflexão que nega, em seu movimento progressivo, em seu esforço de determinação, a imediatez e a certeza sensível.[xxiii] Os leitores de O capital escutam o eco da crítica hegeliana da imediatez já no primeiro parágrafo do livro: a presença imediata, “natural”, da mercadoria cuja evidência empírica, aparência, é negada a seguir pelo trabalho da reflexão.

Nas primeiras obras de Raymond Williams encontramos a equivalência entre experiência e saber, o que, de certa forma, o aproxima de Jean-Paul Sartre e o distancia radicalmente de Louis Althusser, que inclui e dissolve, sem mais, a experiência na ideologia. No livro de entrevistas, Raymond Williams foi questionado a respeito, lembrado pelos entrevistadores de que há processos inacessíveis à experiência (a lei da acumulação do capital, a taxa de lucro etc.), o que impede a passagem das “estruturas de sentimento” e da “experiência” para o conhecimento, atestando a impropriedade de migrar o conceito do campo literário para as estruturas sociais.

Raymond Williams aceitou a crítica, observando que o seu “apelo à experiência” para fundar a unidade do processo social “foi problemático”. E mais: “em certas épocas é precisamente a experiência em sua forma mais fraca que aparece para bloquear qualquer realização da unidade do processo” [xxiv]. O uso de expressões compósitas nem sempre garante uma síntese bem realizada entre matéria e consciência, como aquela realizada por Marx. Fenômenos como alienação e reificação, não por acaso, não comparecem no centro das reflexões de Raymond Williams, sendo solenemente ignoradas pela soberana “consciência prática” e pelas virtudes de uma experiência prisioneira da imediatez.

*Celso Frederico é professor aposentado sênior da ECA-USP. Autor, entre outros livros, de Ensaios sobre marxismo e cultura (Mórula). [https://amzn.to/3rR8n82]

Notas


[i] No Brasil, a divulgação da obra de Williams teve início nos trabalhos de Maria Elisa Cevasco. Ver, a propósito, CEVASCO, Maria Elisa. Para ler Raymond Williams (São Paulo: Paz e Terra, 2001) e “Cultura: um tópico britânico no marxismo ocidental.” in MUSSE, Ricardo e LOUREIRO, Isabel (orgs.). Capítulos do marxismo ocidental (São Paulo: Unesp, 1998);GLASER, André. Raymond Williams. Materialismo cultural (São Paulo: Biblioteca 24 horas, 2011); PALACIOS, Fabio Azevedo. Marxismo, comunicação e cultura (USP: 2014); RIVETTI, Hugo. Crítica e modernidade em Raymond Williams (USP: 2015) e A longa jornada: Raymond Williams, a política e o socialismo (USP; 2012); SOUZA MARTINS, Angela Maria e NEVES, Lúcia Maria Wanderley. Cultura e transformação social. Gramsci, Thompson e Williams (Rio de Janeiro: Mercado de Letras, 2021).

[ii] VRANICKI, Petrag. Storia del marxismo (Roma: Riuniti, 1972).

[iii] PETRUCCIANI, Stefano. Storia del marxismo (Roma: Carocci, 2015).

[iv] ANDERSON, Perry. Considerações sobre o marxismo ocidental (Porto: Afrontamento, s/d), p. 137.

[v] WILLIAMS, Raymond. “Você é marxista, não é?”, in Recursos da esperança (São Paulo: Unesp, 2014), pp. 34-5.

[vi] EAGLETON, Terry. A função da crítica (São Paulo: Martins Fontes, 1991), p. 104.

[vii] HALL, Stuart. Da diáspora. Identidades e mediações culturais (Belo Horizonte: UFMG/UNESCO, 2003), p. 207.

[viii] Cf. MULHERN, Francis. “Culture and society, entonces y ahora”, in New Left Review, número 55, 2009 (edição em espanhol).

[ix] THOMPSON, Edward. “The Long Revolution”, in New Left Review, número 1/9, May-June, 1961 e número 1/10, July-August, 1961. Outra crítica relevante foi feita por KIERN, V. G. “Culture and Society”, in The New Reasover, número9, 1959.

[x] THOMPSON, Edward. “The Long Revolution (Part II)”, in New Left Review I/10 , cit..

[xi]. WILLIAMS, Raymond. A política e as letras (São Paulo: Unesp, 2013), p. 130.

[xii]. Idem, p. 104.

[xiii]. SAYRE, Robert e LöWY, Michael. “A corrente romântica nas ciências sociais na Inglaterra: Edward P. Thompson e Raymond Williams”, in Crítica marxista, número 8, p. 44.

[xiv]. CARDOSO, Ciro Flamarion. “O Grupo e os estudos culturais britânicos: E. P. Thompson em contexto”, in MÜLLER, Ricardo Gaspar e DUARTE, Adriano Luiz (orgs.), E. P. Thompson: política e paixão (Chapecó: Argos, 2012), p.113.

[xv]. SMITH, Dai. Raymond Williams. El retrato de um luchador (Universitat de València, 2011).

[xvi]. WILLIAMS, Raymond. “Democracia e parlamento”, in Recursos da esperança, cit. p. 401.

[xvii]. MATTELART, Armand e NEVEU, Érik. Introdução aos estudos culturais (São Paulo: Parábola, 2004), p. 40. Sobre a centralidade da literatura na vida cultural inglesa, ver EAGLETON, Terry. “A ascensão do Inglês” inTeoria da literatura: uma introdução (São Paulo: Martins Fontes, s/d).

[xviii]. WILLIAMS, Raymond. A política e as letras, cit. p.88.

[xix] .Idem, p.112.

[xx] Idem, p. 113.

[xxi]. WILLIAMS, Raymond. “O círculo de Bloomsbury”, in Cultura e materialismo, cit.

[xxii]. WILLIAMS, Raymond. A política e as letras, cit., pp. 151-160.

[xxiii]. Para a crítica do imediato ver : HEGEL, G. W. Enciclopédia das ciências filosóficas. Em compêndio (1830) (São Paulo: Loyola, 2012), pp. 46-7 e 146.

[xxiv]. WILLIAMS, Raymond. A política e as letras, cit., p. 132.


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